A atual pandemia criou as condições perfeitas para uma transição repentina de milhões de colaboradores dos escritórios das organizações para o trabalho à distância, nomeadamente a partir das suas casas, precipitando o que até ali fora um lento processo de transformação iniciado há décadas. Como dizia Hemingway, sobre a forma como se entra em falência, a mudança acontece primeiro lentamente e, depois, de repente.
Com o aproximar do fim da pandemia, que todos ansiamos, as opiniões dividem-se: os colaboradores vão desejar ardentemente voltar aos seus locais de trabalho, retomando o aspeto social da sua atividade? Ou vão preferir continuar a trabalhar a partir das suas casas? O que acontecerá com estes colaboradores? E com aqueles que desejarem ir mais além e viajar e trabalhar de forma nómada? E como estarão as organizações a posicionar-se nesse sentido? Estarão elas preparadas para estes novos desafios?
Algures no meio estarão as respostas a estas questões e as organizações que melhor souberem abraçar a mudança e adaptar-se a esta realidade serão as que terão maior sucesso, produtividade, confiança e preferência dos seus colaboradores e que certamente alcançarão melhores resultados económicos e sociais e serão mais sustentáveis.
Mas como o fazer?
Em primeiro lugar, há que colocar os colaboradores no centro da liderança e da gestão das organizações. Quando os colaboradores não estão presentes há que questionar toda a forma de trabalhar, o que passa por confiar, apontando para desligar o conceito de presença física da perceção de cumprimento e dedicação. De facto, se já todos sabemos que um colaborador presente não é garantia de empenho e dedicação, agora todos temos de perceber que a ausência física de um colaborador não implica necessariamente que irá relaxar nas suas obrigações – bem pelo contrário: variados estudos demonstram aumentos consideráveis de produtividade nestas circunstâncias.
A confiança leva a que a forma como o trabalho é medido, avaliado e coordenado mude profundamente. Não se trata de uma confiança cega, mas sim despirmo-nos de uma ideia preconcebida, que assenta no paradigma do presencial, do físico.
Acresce, ainda, que a comunicação é uma das atividades que mais deve ser alterada em regime de teletrabalho ou trabalho remoto. Aqui é necessária a criação de formas que funcionem bem para todas as partes, com regras perfeitamente bem definidas e acordadas sobre como comunicar, o que comunicar e em que canais. Por exemplo, com o trabalho remoto poderá haver maior cansaço nas reuniões online em tempo real, pelo que é preferível reduzir ou mesmo eliminar o tempo despendido nesta forma de interação. E nos casos em que a necessidade de reunir se mantenha, poderá deixar de ser necessária a presença simultânea de todos os participantes, podendo ser necessária apenas a presença de um subgrupo, podendo os restantes assistir, posteriormente, a uma gravação em regime assíncrono. Melhor ainda será criar uma transcrição automática, algo já possível tecnicamente, ou a redação de um breve resumo com as principais decisões e conclusões que é importante todos terem conhecimento.
Não menos importante é reduzir a necessidade de comunicação constante e em tempo real. Por vezes tal não é possível – por exemplo com colaboradores noutros fusos horários – mas tal coloca demasiada pressão sobre os colaboradores, reduzindo a produtividade destes. O fundamental é comunicar o certo, na quantidade certa, pelos canais certos.
Por fim, um dos aspetos com que a grande maioria das empresas nunca se preocupa, com exceção das grandes empresas de consultoria, é o da criação de documentação sobre os seus negócios e processos. Num mundo ainda marcado pela presença física e pelo síncrono, este tema é habitualmente visto como uma perda de tempo e ainda assim reveste-se de uma enorme importância na qualidade dos serviços prestados, interna e externamente, assim como no acolhimento de novos colaboradores que, sem documentação, causarão uma enorme diminuição na sua produtividade e uma maior dificuldade de integração na organização. Num mundo assíncrono e de presença remota, a falta de documentação poderá causar enormes dificuldades a todos os envolvidos, tornando mais difícil obter uma resposta de outras pessoas de forma atempada.
Com uma boa liderança e gestão, nomeadamente de recursos humanos, são imensos os benefícios que podem ser retirados do teletrabalho e do trabalho remoto. Para tal, líderes e gestores devem ser capazes de aproveitar as oportunidades, colocando os colaboradores e as suas funções no centro do pensamento e da atividade das suas instituições. Para além disso, devem ser criadas condições para os colaboradores poderem vir a exercer a sua atividade dentro destes novos moldes, sem que isso afete negativamente a sua produtividade, motivação e envolvimento.